Tuesday, February 11, 2025

A estrada (Nicole Siebel)

*Conto publicado originalmente no livro "Expresso 666 (Contos sobrenaturais, de suspense e de terror)", da Andross Editora. 


A estrada parecia eternidades obscuras. O asfalto se misturava com a noite e apenas a chuva se destacava na visão de Lúcia, vindo contra o vidro do carro. O pai dirigia, ela pensava.

Era sorte estarem numa região afastada dos centros, onde a confusão generalizada bloqueara todas as rotas. Ali, conseguiam, ainda, se locomover. 

Júlio acelerava, Lúcia apertava o banco do carro com as mãos. Estavam viajando pela escuridão e somente maus presságios a dominavam. Tentava acalmar o coração acelerado, mas cada vez que fechava os olhos via o olhar vazado de Gabriel e voltava a seus ouvidos o grito desesperado da agonia que a morte da consciência provocava.  O limpador de para-brisa soltou um guincho e ela abriu os olhos, fitando o pai. Ele ainda dirigia, inabalável, apesar de tudo.

-Você acordou. - Ele disse, mantendo os olhos na estrada. Tinha um tom de voz suave. 

Pegara no sono... e o sonho era a lembrança.

Sem obter resposta, ele continuou falando.

-O rádio pegou por um trecho lá atrás. Estavam explicando. A epidemia está por toda a parte e estão tentando controlar. 

-Será que era melhor a gente ter ficado em casa? – Ela perguntou, passando a mão pelo cinto que a prendia ao banco. 

-Não. - O homem foi categórico. 

Lúcia lembrou. Fora questão de horas desde o início da febre de Gabriel até o fluído cerebral vazar pelas suas narinas... A última vez em que o vira, ele estava com os dentes cravados na pata de um dos cavalos da fazenda, coberto de sangue do animal, enquanto sua presa relinchava e escoiceava. Não havia controle. Ninguém curaria seu irmão. 

-Mas não há como saber se ficar em casa é seguro. Ninguém sabe como isso se alastrou. Se tivéssemos ficado... – A voz dela sumiu no meio do protesto. 

-Eu sei, filha. 

Logo depois que saíram de casa, toda a região escureceu. A energia fora cortada, ou caíra. Não havia sequer estrelas para iluminar o mundo: só os faróis da caminhonete. 

Lúcia não sabia para onde estavam indo. Júlio não lhe dissera e não parecia saber.

Estavam rodando por horas, no entanto, e ela sabia que a gasolina ia acabar.

Precisariam parar. E como se fosse resultado do pressentimento, o painel do veículo anunciou a necessidade de abastecimento. 

-Vamos parar no próximo posto. – Júlio declarou, como se estivessem em viagem de férias. 

Lúcia sentiu gana de enfiar as unhas nele. Queria uma reação. Queria reagir.

Limitou-se a apertar, novamente, o estofamento do banco, enquanto seguiam por mais alguns quilômetros. 

Pararam em um posto que deveria estar funcionando, mas aparentava abandono.

Com o motor ainda ligado, Júlio procurou a lanterna que sempre carregava no porta-luvas. 

-Fica aqui. Vou ver se tem alguém. 

A garota observou. Ele caminhou até a loja de conveniência e Lúcia perdeu a visão dele. Encolheu-se no banco. Um garoto doente vinha à mente, na fazenda, mordendo um cavalo. E se o pai também estivesse doente? E se ele, de repente, começasse a convulsionar? Ele estaria também coberto de líquidos estranhos e mostraria os dentes...

Tremia, pensando naquela possibilidade. Cruzou os braços e enterrou as unhas nos ombros, sentindo a pressão delas sobre a pele. A prova de que estava viva. 

Não viu ao certo quando voltaram a rodar. Adormecera outra vez? 

Sentiu um calafrio tomando todo o seu corpo e se contorceu no banco. Estava ficando muito frio por causa da chuva. Voltou-se para o banco de trás e pegou um casaco, enrolando-se nele. 

Júlio continuava dirigindo. Sempre em frente, sempre calmo. No que pensava?

Estaria perdendo a consciência? E se começasse a se esquecer das coisas e virasse como... como... Perdeu-se no pensamento. Era o sono, dominando-a, e ela cedeu. 

Entre cochilos, só via que ainda se moviam. O rosto ao seu lado era constante, sempre olhando para a estrada, nunca a fitando. A face, ela percebeu, de repente, tinha medo. Nela, havia lágrimas. De quem era aquele rosto? O nariz coçou, ela colocou a mão e sentiu uma coisa viscosa. Olhou para os dedos melecados e uma súbita compreensão surgiu. Queria dizer algo, mas, em seu esforço, só conseguiu soltar um grunhido alto, que fez o vulto ao seu lado virar-se para ela, antes de continuar dirigindo. Ouviu um som tranquilizador. Encolheu-se, porque tinha medo.  

Sua cabeça latejava, como se estivesse se esvaziando, lentamente. Tentou conter os furos do nariz, mas isso só fez com que quase se afogasse. Engasgou e cuspiu catarro esbranquiçado. 

Sentia o rosto coçando e usou as unhas para aliviar-se, mas a coceira só aumentava, a dor crescia, a pele ardia. Sua garganta libertava o desespero que a dominava. Por que aquelas sensações todas perturbavam-na? Seu estômago queimava de fome e sua cabeça se consumia de necessidade...

 

O sol se anunciava. O motor do carro morreu num rompante, quando a gasolina se acabou. Só então os olhos lacrimejantes de Júlio encararam a menina que se contorcia ao seu lado, soltando esgares ininteligíveis, arranhando o rosto melado. 

-Que Deus me perdoe. – Sussurrou, enquanto o cano frio e metálico lhe entrava pela garganta. 

Puxou o gatilho.

Thursday, January 30, 2025

Minha primeira paixão coreana

Atualmente, todo mundo tem algum mínimo contato que seja com a cultura coreana. As séries, bandas e artistas da Coreia do Sul têm se destacado no cenário mundial (não vamos esquecer que até Oscar de melhor filme os coreanos já levaram, com o excelente "Parasita"). 

Eu adoro curtir séries e filmes coreanos. Acontece que organizando uns arquivos velhos e com um tempo pra procrastinar nessas férias, me dei conta de que minha primeira paixão pelos produtos culturais da Coreia começou antes mesmo de Gangnam Style bombar no Youtube (e isso já faz um tempinho - aliás, jovens com 15 ou - ainda conhecem PSY?). 

Isso porque passei boa parte dos meus dias nos anos 2000 montando bonequinhas virtuais chamadas "Candydolls", originárias do site coreano "Candybar", hoje extinto. Eu adorava montar dolls, e meu formato favorito era justamente esse formato coreano, que tinha bonequinhas maiores e fofinhas. 

Bateu uma nostalgia e, ao pesquisar, vi que a maioria dos sites de dolls e principalmente das candydolls parece ter sido varrido da face da terra. Me deu um pouco de tristeza... Eu me diverti tanto com os dollmakers e blogs de dolls na minha adolescência...

Vida que segue, a gente sabe que os tempos mudam e também o gosto da galera. Ficam algumas das minhas candydolls para quem não conhece saber como eram, e quem montava dolls curtir a nostalgia junto comigo. Talvez eu poste mais delas no futuro.

Essas têm bases adaptadas do Candybar: 


Essas têm bases e roupinhas que eu mesma desenhei (sobrepondo imagens e fazendo pixel a pixel, no Paint - é, eu me dava ao trabalho). Só cabelos e rostos foram adaptados do Candybar.

Alguns sites de dolls e candydolls que ainda estão na ativa: Dolls.com e Dolls da Katchoo.

A estrada (Nicole Siebel)

*Conto publicado originalmente no livro "Expresso 666 (Contos sobrenaturais, de suspense e de terror)", da Andross Editora.  A est...